50 anos de carreira de um dos maiores ícones do Carnaval, Getúlio Cavalcanti
Texto e fotos por Guilherme Menezes
Getúlio Cavalcanti, nome reconhecido do frevo,
tem uma obra composta de dez CDs, com vários sucessos que fazem parte do carnaval
pernambucano, sendo Último regresso o
mais conhecido. E parece que seu destino não poderia ser diferente; começou a
ter contato com a música desde cedo: “Eu recebi meu primeiro presente aos cinco
anos de idade, foi um realejo, e logo fui tentando tocá-lo, era como se já
tivesse uma interação antiga com ele... Depois ganhei uma sanfona, aos seis ou sete
anos...” Aos oito anos, Getúlio entrou na banda de Camutanga, onde começou a
estudar música, com o instrumento sax soprano.
Tempos depois, Getúlio deixou a cidade e
se mudou para Timbaúba, porque em sua cidade natal os estudos só iam até a
quarta série. Lá, ficou interno em um colégio e perdeu o contato com a música. Só
alguns anos depois, ele voltou a tocar: “Com 12 anos, ganhei de presente um
violão e aí comecei, de fato, a entender um pouquinho mais de música, a gostar
mais da música, a cantar melhor... Nesse tempo, eu já cantava... Depois achei
que seria fácil compor, uma vez que eu já tinha uma base...”, diz Cavalcanti. Aos
15 anos, participou da Orquestra Sinfônica de Camutanga, tocando e cantando os sucessos
da época.
Mas foi quando o maestro veio para o Recife
que ele deu os passos mais importantes para consolidar sua carreira. Quando ele
veio, junto com o violão, começou a participar de programas de calouros, até
que, aos 19 anos, já cantor profissional, ingressou na Rádio Clube. Nessa época,
conheceu o maestro Nelson Ferreira e com ele gravou sua primeira música para o carnaval
de 1963, a
histórica Você gostou de mim, que
teve grande reconhecimento. O artista completa, este ano, seus 50 anos de
carreira
Ao ser perguntado sobre o porquê de sua
escolha pelo frevo, Getúlio declarou: “Por um motivo muito simples, quando
cheguei na cidade do Recife, eu vi que havia um grande espaço, no frevo, para o
compositor. Existiam aqueles grandes discos, excelentes discos, feitos pela Rozenblit...
Ela fazia com que todo ano tocassem músicas novas de frevo, músicas que todo
mundo cantava”. Os discos saíam nos meses de setembro, outubro e novembro, que
eram as prévias de carnaval. Segundo o artista, as rádios eram poucas e a
concorrência também, de forma que o que tocava na rádio era ouvido por todos.
Ele destacou as Rádios Clube, Jornal, Tamandaré e Olinda como as principais, as
que tocavam o estilo carnavalesco. “Eu senti que o frevo poderia ser um bom
caminho pra que eu pudesse compor e participar do movimento carnavalesco; eu
sempre gostei muito de carnaval”.
Sobre o boom na carreira, o carnavalesco também citou como de grande ajuda,
a participação de um amigo seu, Moisés Kerstmann. “No ano posterior ao
lançamento de Você gostou de mim, eu
fiz um frevo-canção chamado Solteirão,
que foi uma homenagem que eu fiz ao Clube dos Solteiros do Recife. Imagine só,
clube dos solteiros... O presidente do clube era um grande amigo meu, o
jornalista Moisés Kerstmann. Infelizmente não está mais conosco. Esse cidadão
me ajudou em tudo. Se
não fosse ele, talvez eu não estivesse participando do carnaval pernambucano
como participo. Ele me levava para as prévias, fazia com que eu fosse destaque
nas colunas sociais que ele escrevia... Era um grande jornalista,
inteligentíssimo.”
“Quais foram as coisas que mais o tocaram
nestes 50 anos de carreira?”, perguntei. Getúlio respondeu: “Uma das coisas foi
a minha primeira apresentação do meu frevo-canção no concurso da Prefeitura em
1963, defronte ao Diario de Pernambuco, que era chamado de QG do Frevo, na Praça da Independência. Ali era colocado um palco
imenso, com jornalistas de nome, eu me lembro de todos eles ali, fazendo o
concurso”. O concurso foi numa segunda-feira de carnaval, com as músicas que estavam
sendo tocadas no período. E o artista continua: “Eu fiquei em terceiro lugar
nesse concurso, Nelson Ferreira foi segundo e Capiba foi primeiro. Perdi pros
dois... Não é perder, não é? Foi uma tarde histórica pra mim e eu tive muita
alegria em participar”.
O artista diz que outra grande alegria que
sentiu foi ser reconhecido pela Prefeitura do Recife, quando ela fez um carnaval
em homenagem a ele. Foi a primeira vez que Getúlio subiu ao palco do Chevrolet Hall,
na festa do Baile Municipal. Na ocasião, o artista subiu para cantar com o
maestro Spok.
“Uma alegria constante é sair com o
Bloco da Saudade pelas ruas do Recife, pelas ruas de Olinda, sentindo o cheiro
de xixi daquelas ruas estreitas, entendeu? E comendo poeira, que eu acho que o
artista é isso”, Getúlio complementa.
O compositor diz que recebeu grandes
influências no seu trabalho musical. Em primeiro lugar, de Nelson Ferreira, o
qual ele intitula como seu primeiro mestre, segundo Capiba, também como grande
poeta, “a poesia de Capiba é uma poesia pura e que fala das coisas normais do
cotidiano” e em terceiro tem Antônio Maria, “ele fazia da música dele o que eu
chamo de a crônica. Antônio Maria não era só um cronista do jornal, ele era da
música também. Ele fazia crônica da vida, das pessoas, e isso me influenciou
muito”.
Quando toquei no assunto sobre os
comentários que dizem que o frevo não se renova, Getúlio declarou: “Lamento quando
dizem que o frevo não mudou...Qual o termo que você usou mesmo? “Renovou.” Veja
bem, alguém poderia me dizer quando o Fado se renovou, quando o Tango se renovou,
a Valsa se renovou? Inovar em quê, em que sentido? Quando a música vem de raiz,
é histórica, não tem como você mudar tudo. Você pode trazer alguns instrumentos
novos, qualquer coisa, mas mudar tudo é impossível. O maestro Spok fez algo
muito bom, o frevo estava precisando, ele fez as pessoas terem vontade de
sentar pra escutar frevo”.
“E sobre essa vitória recente, a de que
o frevo se tornou patrimônio cultural da Humanidade?” Getúlio: “Pronto, essa é
um prova cabal de que o frevo tem seu valor. Esse trabalho todo que foi feito, o
fato de ter sido coroado com essa distinção... Jamais essas músicas que vendem
duzentos, trezentos, quatrocentos, quinhentos mil discos vão conseguir uma
láurea dessa natureza. Agora o frevo sim, porque ele é raiz, é história. Não
acredito que exista outro estado do país que tenha toda essa riqueza incomensurável
que Pernambuco tem”.
Getúlio Cavalcanti lança este ano seu
novo CD, Getúlio Cavalcanti – 50 anos de
Lirismo, e pretende pô-lo à venda já neste mês de janeiro. O disco é uma
coletânea dos seus 18 maiores sucessos, como Último regresso, Você gostou
de mim e O bom Sebastião, feitos
em sua longa e admirada jornada. “Vou estar fantasiado como faço em todo
carnaval, dando minha contribuição a alguns blocos, como o Bloco da Saudade do
qual eu gosto muito, e provavelmente vendendo meu ‘cdzinho’ na ocasião” [risos].
Getúlio finaliza a entrevista emitindo sua
opinião sobre o carnaval dos dias atuais: “O que eu mais queria é que
resgatassem e valorizassem mais a cultura local, o maracatu, o caboclinho, o frevo,
claro, e outros estilos da terra. Isso é importantíssimo para eternizar nossa
cultura”.
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