Em nova instalação na Usina de Arte, obra de Denise Milan conduz a sobrevivência humana ao ventre da terra
Crédito das fotos: Divulgação/Usina de Arte |
Compondo o acervo do museu pernambucano desde 2021, “Banquete da Terra” terá uma gruta como nova estrutura expositiva no Parque Artístico-Botânico do espaço, assumindo novos debates para a relação entre a natureza e a existência humana
É no núcleo da Terra, onde o tempo se cristaliza em pedras, e a história é escrita nas camadas geológicas do mundo, que nasce "Banquete da Terra", da artista paulista Denise Milan. A obra, que transcende o espaço expositivo para se tornar um portal entre o passado e o futuro, faz convite ao espectador para
que ele devore, com os olhos e os sentimentos, a trajetória da humanidade. A partir de 31 de agosto, o banquete telúrico de Milan estará servido em uma mesa diferente, ganhando uma gruta como nova instalação no Parque Artístico Botânico da Usina de Arte. A inauguração, a partir das 16h, contará com a presença da artista.Após se destacar nas exposições Glasstress (2019) e Unbreakable Woman In Glass (2020), em Veneza, “Banquete da Terra” retorna ao Brasil para ser exposta dentro do projeto Janelas CasaCor que, em meio a pandemia, espalhou contêiners-vitrine por 13 bairros de São Paulo. Ainda em contexto pandêmico, em outubro de 2021, a obra ganhou moradia na Usina de Arte, passando a compor o acervo fixo da instituição. Sintonizando a criação de Denise Milan ao contemporâneo e ao projeto museológico do espaço, que prevê a arte em simbiose com a natureza, a obra sai do contêiner e passa a estar exposta em uma gruta criada pela arquiteta paulista Andrea Helou. A instalação recebeu projeto da iluminação da Light Works, com a execução acompanhada pela lighting designer Marcia Chamixaes.
“A obra está encontrando agora o acolhimento e abrigo. A gruta é como um útero materno, nos levando ao ventre da terra que é o caldeirão cósmico onde os elementos se misturam para proporcionar este banquete. A obra é uma oferenda à humanidade como registro da nossa sobrevivência. Está na hora de nos conectarmos com a natureza para entendermos do que ela é feita, e assim nos deslocar para uma posição que nos permita enxergar que nossas origens datam nosso início e talvez eventos futuros”, descreve Milan.
Para o curador da Usina de Arte, Marc Pottier, o novo momento simboliza uma outra investigação a visão total da artista. “O que estamos apresentando agora nessa gruta é o pensamento da artista, criando uma harmonização do trabalho dela, que é preciso considerar. O museu está respeitando totalmente a criadora. Demos a palavra para ela escolher a arquiteta, e escolher o tamanho da gruta em função da obra. É o movimento de valorizar e respeitar a criação original com a própria artista, colocando em evidência a conexão entre arte, natureza e espiritualidade, que faz parte da filosofia da Denise Milan”, pontua Marc.
Um banquete de milhares de anos
Na instalação, montada em torno de uma mesa, estão servidos pratos elaborados a partir de ingredientes “da terra”, como cristal, pirita, amonita, ouro, prata e bronze, apresentados em diversas texturas. Nos últimos anos, Denise Milan tem expandido sua pesquisa explorando o universo das pedras como microcosmos de natureza, desenvolvendo trabalhos que dialogam com diversas áreas, como ciência e tecnologia, antropologia, arqueologia, filosofia, literatura, teatro e música.
Sua prática artística se torna um ponto de convergência entre esses campos, criando uma ponte entre a arte e o conhecimento científico para explorar as complexidades da natureza e da existência humana. Em suas obras, as pedras se transformam em símbolos de resistência e testemunhos históricos, ressoando com o tempo profundo e a conexão intrínseca entre o homem e a Terra. Recentemente, foi convidada pela USP para abrir o evento "USP Pensa Brasil 2024", onde apresentou sua videoarte "Das Américas para Todo Planeta Azul", refletindo sobre os desafios da COP 30 e a crise climática.
No cenário internacional, sua obra também ganhou destaque em (Boston) Cambridge, EUA, onde, a convite do diretor fundador do MIT.nano, Vladimir Bulović, Denise foi a artista selecionada para inaugurar a nova proposta de colaboração transdisciplinar "Encounters” com uma discussão sobre sua abordagem visionária, que une ciência, tecnologia e humanidade. A exposição apresentou seis gravuras da série “Fumaça da Terra”, revisitando o compromisso humanístico e ecológico que marca a trajetória de Milan nos últimos 45 anos.
Para a presidente da Usina de Arte, Bruna Pessôa de Queiroz, a nova plataforma de exposição da obra representa um endosso sobre as necessidades de diálogo entre o meio ambiente e a arte. “A nova instalação resgata a ancestralidade e a memória geológica com um chamado urgente para a reconciliação com a Terra, conectando a arte às questões globais de sustentabilidade e à sobrevivência de povos e culturas. Em um momento em que as crises climáticas e ecológicas exigem ações coletivas, a obra de Milan se torna um símbolo poderoso da necessidade de reavaliarmos nossa relação com o planeta, inspirando um diálogo profundo sobre a preservação da vida”, afirma Bruna.
Sobre Denise Milan
Denise Milan nasceu em São Paulo em 1954. Escultora e artista contemporânea, interage com especialistas em ciência e tecnologia, antropologia, filosofia, literatura e música. Suas obras estão expostas em várias instituições e espaços nacionais e internacionais.
A artista usa a pedra como eixo criativo em esculturas, performances urbanas, poesias, projetos multimídia, operas e assemblages.
Pioneira e ativista do movimento da Arte Pública no Brasil e exterior, algumas de suas obras publicas incluem performances: U Ura Muta Uê em Belém,Pará, Redenção do Pelourinho em Salvador, Bahia, Sectiones Mundi em São Paulo, Museu de Arte Moderna, Entes em São Paulo, SESC, no Améfrica em Brasília, no CCBB - Centro Cultural do Banco do Brasil. Esculturas públicas em São Paulo: Drusa no Anhangabaú; Ventre da Vida no metrô Clínicas; Um Furo no Espaço no Museu de Arte Contemporânea; Palas Atenas no Campus da USP; Tempos de Cura no Hospital Albert Einstein e Planitude no Instituto Fleury e Pedra Brasilis na Natura.
No exterior, Americas’ Courtyard no Adler Planetarium em Chicago, Genetic Blue Stone no Kennedy Center, em Washington, D.C.; In the Realm of Love and Forgiveness em Assis, Itália; COP22, DO-FEST no Emerson Collective, tríptico: Oceanic, Cosmic and Earth Womb em Marrakech, no Marrocos; na Glasstress, durante a 58ª Bienal de Artes de Veneza e recentemente Unbreakable Women in Glass, ambas na Fundação Berengo, Itália, e MIT.nano, em Boston, EUA.
Em São Paulo, participou da 20ª, 21ª e 33ª, Bienal Internacional de Arte de São Paulo; exposições no Museu de Arte Moderna de São Paulo – MAM SP; Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand – MASP; Museu de Arte Contemporânea; Galeria São Paulo; Galeria Nara Roesler; Galeria Virgílio; Galeria Lume; SESC; CCBB - Centro Cultural do Banco do Brasil, Rio de Janeiro; SP- ARTE e ArtRio. No exterior, suas exposições principais foram: Barbican Centre em Londres; MoMA PS1 em Nova York; EXPO 2000 em Hannover; Hakone e Museu Open-Air em Osaka; Museu de Arte Contemporânea, Art Institute e Sectiones Mundi no Museu de Arte Moderna; Chicago Cultural Center em Chicago; Palazzo del Monte Frumentario em Assis: Wilson Center em Washington D.C.; Galeria D’Architecture em Paris; Georgetown University, Washington D.C.; University of Utah em Salt Lake City e Brighan Young University em Provo; COP22 – DO-FEST, Emerson Collective em Marrakech e na Glasstress, Fundação Berengo, Veneza.
Sobre a Usina de Arte
Instalado onde funcionou a Usina Santa Terezinha (maior produtora de álcool e açúcar do Brasil nos anos 1950), na cidade de Água Preta, Mata Sul de Pernambuco, o projeto Usina de Arte conecta arte, cultura e meio ambiente, a partir de um museu de arte contemporânea ao ar livre, dentro de um Parque Artístico Botânico. Nele, estão instaladas mais de 45 obras e instalações de nomes como Marina Abramović, Regina Silveira, Alfredo Jaar, Geórgia Kyriakakis, Saint Clair Cemin, José Spaniol, Claudia Jaguaribe, Matheus Rocha Pitta, Juliana Notari, José Rufino, Flávio Cerqueira, Bené Fonteles, Hugo França, Rizza Bomfim, Paulo Bruscky, Denise Milan, Marcelo Silveira, Liliane Dardot, Maria Tereza e Thiago Sobreiro, Marcio Almeida, Frida Baranek, Artur Lescher, Carlos Vergara, Júlio Villani, Iole de Freitas e Vanderley Lopes.
Em meio a um trabalho de reflorestamento com plantas de mais de 1.000 espécies, em uma área de 40 hectares, o Parque Artístico Botânico é eixo central da iniciativa que irriga outras ações de desenvolvimento para a criação de estruturas para geração de renda e valor para a comunidade de 6 mil moradores no entorno do projeto. São exemplos o Fab Lab Mata Sul - Usina de Arte com terminais de computadores conectados à internet, impressoras em 3D e cortadora a laser para projetos da comunidade, a Escola de Música, a Biblioteca e Centro de Conhecimento público com mais de 5 mil títulos, além de parceria com as unidades escolares no apoio de novas práticas pedagógicas.
O objetivo é estimular o turismo, e a consequente atividade econômica na região da Mata Sul de Pernambuco, criando um ambiente favorável ao empreendedorismo na localidade, que viu nascer restaurantes, pousadas, pesque-e-pague, centro de artesanato, guias para passeios ecoturísticos, camping e a cultura de hospedagens domiciliares. "Essa guinada não seria possível sem o intenso envolvimento da comunidade, parte efetiva de todo o processo, e que, ao se sensibilizar com o potencial transformador da arte, tem contribuído sistematicamente com o projeto, desde a sua gestação até a atual condição de pilar de sustentação dele", explica Bruna Pessoa de Queiroz, presidente da Associação Socioambiental e Cultural Jacuípe, que gere a Usina de Arte.
O grupo reúne mais de 40 membros de segmentos plurais da comunidade da Usina Santa Terezinha, sendo viabilizado a partir do apoio de pessoas físicas e jurídicas.
Visitação
A cerca de 150km do Marco Zero do Recife, o Parque Artístico-Botânico da Usina de Arte é aberto à visitação do público, das 5h30 às 18h, e tem acesso gratuito. Saindo do Recife, os visitantes devem seguir pela BR 101 Sul, sentido Alagoas, até o centro da cidade de Xexéu. De lá, o público segue pela rodovia PE99, que começa em frente à Paróquia de São Sebastião, e leva até a Usina, situada no Km 10. Entre as opções de alimentação, estão os restaurantes Jardim Botânico, a Pizzaria Estação dos Sabores, Mandacaru Abacate, Ró Lanches, Restaurante Alquimia e Restaurante Capim de Cheiro.
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