As Confrarias, de Jorge Andrade, finalmente nos palcos brasileiros

As Confrarias. Foto: Américo Nunes
Escrita por Jorge Andrade e dirigida por Antonio Cadengue, com realização de Lúcia Machado e produção da Companhia Teatro de Seraphim, a peça, que tem o incentivo do Funcultura, e é inédita no Brasil, situa-se em fins do século XVIII, focalizando, de um ângulo incomum, a Conspiração Mineira. Trata-se da fase da decadência e do fim do ciclo do ouro, onde o autor esboça a estrutura da sociedade colonial. As Confrarias estreia neste domingo (9), às 20h, no Teatro Barreto Júnior, no Pina, e segue em cartaz até o dia 30 deste mês de junho. Os ingressos custam R$ 10 e R$ 5 (meia). Para Lúcia Machado, realizadora do projeto, o objetivo é oferecer ao público o melhor da companhia. “Que esse público amigo e cúmplice nos acolha, agora, com o mesmo entusiasmo e amorosidade de sempre.”

O enredo aborda um tema recorrente da dramaturgia de Jorge Andrade: a morte sem sepultura. Auxiliada por Quitéria, amante do filho, José, morto por suspeita de conspiração, Marta transporta o corpo numa rede, aparentemente em busca de solo sagrado para enterrá-lo. Em sua via crucis, percorre as sedes de quatro Confrarias – a da Ordem Terceira de Nossa Senhora do Monte Carmelo; a do Rosário; a Irmandade de São José e a da Ordem Terceira das Mercês. Em todas elas, estabelece um jogo que ultrapassa a intenção de, simplesmente, enterrar o filho, conseguindo, com isso, desmascará-las e fazê-las expor os seus interesses econômicos, preconceitos, ressentimentos, ódios e ambições. No elenco, estão: Alexsandro Marcos, Brenda Lígia, Carlos Lira, Gilson Paz, Ivo Barreto, Lúcia Machado, Marcelino Dias, Marinho Falcão, Mauro Monezi, Nilza Lisboa, Ricardo Angeiras, Roberto Brandão, Rudimar Constâncio e Taveira Júnior.


Antonio Cadengue.
Foto: Américo Nunes
Segundo o encenador Antonio Cadengue, nesta montagem, a interpretação do elenco foi construída a partir de minuciosa análise do texto, buscando-se assim, por meio das palavras, uma poética para a voz e o corpo. Segundo ele, “a ênfase é encontrar no trabalho com o elenco uma individualidade análoga à do personagem que cada um deles interpreta, seja no gesto, no corpo, ou na música das falas”. O encenador buscou junto ao elenco uma expressão da “totalidade da personalidade carnal e psíquica”, tal como professa Grotowski. Explica que foi preciso “dominar o corpo, as sensações e enunciar cada palavra em sua essência. Mas sem deixar de ficar atento à metamorfose e ao distanciamento que todos vivem em cena, inclusive por intermédio da ilusão”. Para Cadengue, a montagem está imersa no conceito de “Ilusão”: não a mimese absoluta, mas aquela mais próxima de sua etimologia latina (in-lusum), que expressa sem maior ostentação a situação daquele que (ou do que) está em jogo: “Uma ação por meio da qual nos é mostrado o que está ‘através’, o que parece ‘não ser’ e, no entanto, ‘é’: este é o leitmotiv de nossa As Confrarias”, conclui.

A Companhia Teatro de Seraphim (CTS) há algum tempo pesquisa e admira a obra de Jorge Andrade, que agora leva à cena, de sua autoria, As Confrarias. Desde 1993, que a Companhia Teatro de Seraphim programou-se para este momento, que agora chega à sua realização, por meio de Lúcia Machado, sua proponente no Funcultura 2012/213: a montagem de As Confrarias, de Jorge Andrade. Dá-se continuidade ao projeto de sua ainda incompleta Trilogia Brasileira (As Confrarias, de Jorge Andrade; A Morta, de Oswald de Andrade, e Senhora dos Afogados, de Nelson Rodrigues). Projeto que buscava, e busca, construir um painel, ainda que cheio de lacunas, da dramaturgia nacional, a partir das especificidades desses três dramaturgos que pensaram o ser humano e a realidade brasileira, cada um ao seu modo. Um painel em que se evidencia a tentativa de compreender o fruto das ações dos homens e a gesta dos seus antepassados, a partir da emoção e da escolha que fazemos, e o público, das diversas manifestações simbólicas que formaram o tecido da vida na sociedade brasileira, do século XVIII até hoje.

As Confrarias. Foto: Américo Nunes
Dessa Trilogia, a Cia. levou à cena, em 1993, Senhora dos Afogados, de Nelson Rodrigues, obtendo uma boa repercussão, de público e de crítica, local e regional; nacional e internacional, como se pode depreender da trajetória do espetáculo: temporada regular, no Teatro Barreto Júnior (Recife/1993); participação em festivais, mostras, eventos vários e excursões (III Festival Nacional de Teatro e Dança de João Pessoa/1993; III Festival de Inverno de Garanhuns/1993; XVIII Festival de Inverno de Campina Grande/1993; I Porto Alegre em Cena, Porto Alegre/1994; programa comemorativo do Aniversário da Cidade do Recife/1993, e do Dia Internacional do Teatro, João Pessoa/1994; excursão a Petrolina/1994; a Portugal – Lisboa, Porto e Tondela – Projeto “Cumplicidades” – Mostra de Artes do Nordeste do Brasil em Portugal, promovido pela Fundação Joaquim Nabuco – Brasil – e ACERT e GESTO-Portugal/1994); do “Janeiro de Grandes Espetáculos”, Recife/1996). Realizou, ainda, nova temporada no Teatro Apolo/Recife/2001.

Com a montagem de As Confrarias, a CTS dá continuidade a esse projeto, importante intervenção na sua linha de investigação, na sua proposta estético-ideológica e no seu compromisso com a cena pernambucana, da qual participa desde 1990, reunindo um grupo de criadores inquietos e compromissados com o teatro pernambucano, do qual participa desde então, no sentido de fazê-lo dialogar com a cena contemporânea. E o faz, por meio de uma dramaturgia de qualidade artística inquestionável, ao mesmo tempo em que retoma o seu ritmo de produção sistemática, que marca a sua história desde a sua fundação. É, pois, com o prazer de quem vê realizado um “sonho”, um desejo acalentado ao longo de tantos anos, que agora vem contar essa história, para todos nós, artistas e espectadores. Porque, como diz o próprio autor: A memória pessoal só tem interesse quando deixa de ser de um e passa a ser de todos.

Serviço:
As Confrarias
Teatro Barreto Júnior
Rua Estudante Jeremias Bastos – Pina
(81) 3355-6398
9 a 30/06 (Qui a Dom) – Exceto no dia 23/06
20h
Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia)
Teatro Adulto / Faixa etária: 16 anos

Duração: 1h30

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