Entrevista: Lenice Gomes
Lenice Gomes. Foto: Arquivo Pessoal |
Por
Gianfrancesco Mello
Natural de Japi, no Agreste pernambucano.
Escritora, licenciada e bacharel em História, especialista em Literatura Infantojuvenil,
pesquisadora e contadora de histórias. Ministra cursos, oficinas e palestras,
autora dos livros infantis: Na boca do mundo, Quando
eu digo digo digo, O tempo perguntou
pro tempo, Brincando adivinhas, recomendado pela Fundação Nacional do Livro
Infantil e Juvenil. Ela viaja o Brasil revelando as mágicas possibilidades que
o universo da literatura pode oferecer a educadores e estudantes. A
pernambucana Lenice Gomes, autora de mais de 30 livros infantojuvenis,
publicados pelas mais importantes editoras do País, conversou com o repórter
Gianfrancesco Mello sobre sua aptidão pela literatura e seus futuros projetos.
Agenda Cultural - Lenice, em que momento você percebeu sua aptidão
pela literatura? Foi influência de alguém?
Lenice Gomes - Nunca pensei que seria escritora para infância. Queria ser atriz
de teatro, cheguei a estudar Iniciação ao Teatro em São Paulo, na Escola/Teatro
Macunaíma. Comecei a escrever graças a um convite e que acabou sendo uma
provocação. Eu já fazia algumas performances nas escolas, nas bibliotecas, nas
livrarias, para crianças. Sempre levava Manuel Bandeira, Cecília Meireles,
Mario Quintana, Joaquim Cardozo, sobretudo, aquele primeiro, meu querido. Com
esse convite, eu me apropriei de modo mais profundo do universo da tradição
oral, dos ditos, das adivinhas.
AC - Qual foi o primeiro livro que você escreveu? Como surgiu a
ideia dele?
LG - Viva eu, viva tu, viva o
rabo do tatu. Foi um convite da Editora Bagaço que queria um livro com o
universo das parlendas e dos trava-línguas. Então, fui pesquisando e me
encantando ainda mais por essas palavras. Para escrevê-lo, fiz muitas leituras
de pesquisadores da tradição oral como Câmara Cascudo, Sílvio Romero e outros.
Mas, na sala de aula, quando professora, eu já levava esse meu fascínio pelas
brincadeiras populares para meus alunos.
AC - Você já viajou por grande parte do Brasil ministrando
palestras, cursos e oficinas. O que mais lhe chamou atenção nas contradições
culturais do nosso País?
LG - Nosso Brasil é
heterogêneo, mas não me prendo a questões estritamente regionais. Eu me sinto
em casa em qualquer parte que for. Às vezes, percebo variações em algumas
cantigas, histórias... Vejo também que várias crianças desconhecem muitas
coisas da tradição oral, mas percebo que elas ficam curiosas e deslumbradas. São
textos que têm uma grande acolhida. Essas viagens são também uma fonte de
inspiração. As palavras, os costumes, o jeito de se expressar estimulam a minha
criação.
AC - Você escreveu mais de 30 livros. Como você pensa nas
temáticas desses livros? É necessária uma pesquisa de muito tempo?
LG - Os recontos, os contos
populares, as lendas e os mitos, mas não apenas os brasileiros, sempre me
inspiraram. Sobre as temáticas, são múltiplas. Já o tempo depende muito da
história. A menina que bordava bilhetes (Cortez),
por exemplo, era uma ideia antiga que escrevi numa viagem para Salvador. Pererêêê Pororóóó (DCL) demorou uns
quatro, cinco meses porque passei um bom tempo lendo sobre sacis. Fiquei
pensando muito sobre como seria a história, quais adivinhas eu colocaria,
conversava com meu filho e com amigos. Cheguei a levar dez livros sobre sacis
na mala (risos) numa das viagens. Tudo eu ia anotando. Muitas das brincadeiras
e das histórias vêm da voz da minha mãe, do meu pai.
AC - O público fica encantado com os seus livros. Como você recebe
esse entusiasmo dos leitores?
LG - É sempre um grande
presente para o escritor essa relação com o leitor. São encontros muito
gratificantes. Quando participo dos projetos de leitura que, cada vez mais, tem
se espalhado pelo país, percebo o fascínio das crianças com o meu jeito de
brincar, contar, dizer as palavras. Há curiosidades, surpresas, perguntas as
mais diversas sobre a minha vida. Escrever para criança me faz bem, porque
preserva a infância que está dentro de mim. Visito muitas escolas, bibliotecas
e sempre estou sendo provocada a escrever mais. E sempre me dão muitas ideias.
É uma rica troca. Exupéry escreveu que somos responsáveis pelo que cativamos e
eu me sinto responsável pelo que escrevo, porque estou preocupada com a
formação de leitores, sobretudo, críticos e reflexivos.
AC - O reconhecimento também vem por meio do Selo Altamente
Recomendável da Fundação Nacional do Livro e Leitura (FNLIJ). Quando uma
escritora como você chega a esse patamar, pode-se dizer que já alcançou o
verdadeiro reconhecimento? Por quê?
LG - Brincando adivinhas (Paulinas), que também
foi finalista do Jabuti, e Mãe d’água:
uma lenda do mar (DCL) ganharam o selo. Fico muito feliz, porque é um
reconhecimento da minha produção. Participar dos catálogos das feiras
internacionais também é uma verdadeira honra. Isso tudo me dá mais estímulo
para continuar com a minha caminhada literária.
AC - Por onde você passa, através de um bate-papo, você frisa a
importância do professor para a formação de leitores e incentiva o despertar
nas crianças no que diz respeito ao gosto e ao fascínio pela leitura. O Brasil
ainda precisa melhorar nesses aspectos? Por quê?
LG - Eu acredito que a gente
tem avançado muito, mas ainda falta muito a ser feito. Há escolas que visito e
encontro um cuidado, um zelo com a literatura infantil. Já outras precisam
alargar mais o olhar para o livro infantil. Creio que já podíamos estar melhor.
Mas as feiras, as bienais, os salões do livro têm aproximado mais as pessoas da
literatura. A maioria só precisa de um incentivo para gostar do livro.
Precisamos estimular o reconhecimento e o valor do texto literário. O educador
só pode iluminar o outro se estiver iluminado, encantado também pelo mundo das
letras. Tenho ainda muitas inquietações.
AC - O que os seus leitores podem esperar de novidades daqui para
frente? Quais dicas você daria para os pais, professores e o público
infantojuvenil?
LG - Minha cabeça está fervilhando de
ideias (risos). Plurais, múltiplas! Estou organizando coletâneas com vários
contadores e escritores sobre histórias de amor. No início do ano que vem, deve
estar saindo o Vozes do sertão. Nele,
temos escritores da Bahia, da Paraíba, de Alagoas, do Ceará, do Rio Grande do
Norte e daqui de Pernambuco. São histórias recolhidas do sertão nordestino.
Minha dica é que sempre, sempre comprem livros, leiam junto com seus filhos,
alunos, troquem ideias, escrevam e vão às bibliotecas, às livrarias, às
contações de histórias. Temos tantas coisas pra ler, ver e ouvir!
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