Meu Bairro... Moro Aqui
Por Felipe Mendes
Fotos Joás Benedito
Continuando, chegamos à Igreja das Fronteiras, onde morou Dom Helder Camara. Logo ao lado fica a Casa Provincial Nossa Senhora das Graças. Aqui fica também um memorial e o Centro de Documentação Helder Camara. Na frente da bela igreja nos deparamos com uma estátua de Dom Helder, o “dom da Paz”, que se inseriu de maneira definitiva na vivência do Estado por sua ação religiosa, social e política.
Seguindo, alcançamos a Av. Agamenon Magalhães. Além de ser a mais movimentada do bairro, a via é uma das principais de toda a Região Metropolitana. O vai e vem incessante de automóveis e pedestres acelera nosso passo e chegamos à Rua Henrique Dias. Logo encontramos a Casa do Estudante de Pernambuco, fundada em 1931. Bem em frente fica o Colégio da Polícia Militar. Muito próximo, Ricardo Rama aponta o Instituto de Recursos Humanos (IRH): “eu trabalho aqui”, afirma nosso guia, enquanto ressalta as vantagens de ir e voltar a pé para o trabalho.
Ainda na mesma rua fica o Cinema da Fundação, sala de cinema mantida pela Fundação Joaquim Nabuco. Ricardo Rama frequenta o cinema porque “aqui passam filmes ignorados pelo circuito comercial”, como explica. Na entrada, uma loja da Editora Massangana – também da Fundaj – oferece livros e publicações diversas. Entramos e encontramos Kléber Mendonça Filho, que trabalha há 13 anos no cinema e, desde 2001, divide com Luiz Joaquim a escolha dos filmes que são exibidos aqui.
No café localizado na entrada da sala de exibição, Kléber – que também é crítico de cinema e cineasta – explica que o cinema “passa filmes que, em princípio, não chegariam ao Recife de outro jeito”. Ele ressalta o fato de se exibir filmes do mundo inteiro aqui a preços populares. Algumas sessões ainda são gratuitas. De terça a domingo, os apreciadores do cinema despido de máquinas publicitárias podem se sentar confortavelmente na Sala José Cavalcanti Borges para assistir aos filmes da extensa programação de festivais e programações temáticas oferecido pelo Cinema da Fundação.
Entramos na sala de exibição, que tem 200 lugares, sendo 3 para cadeirantes. A assistente dos diretores, Vera Cavalcanti, explica que o espaço também dialoga com entidades próximas, como a Escola da Polícia Militar, que realiza eventos aqui. Saímos do cinema e seguimos pela Rua Jener de Souza, onde encontramos o Memorial da Medicina de Pernambuco.
Instalado no prédio onde funcionou a Faculdade de Medicina, o Memorial abriga ao todo sete instituições instaladas em seu belo sobrado localizado na margem do Rio Capibaribe. Entre elas, o Museu da Medicina, a Regional Pernambuco da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores, a Academia de Artes e Letras de Pernambuco e a Academia Pernambucana de Medicina.
Chegamos à Praça do Derby, cortada ao meio pela Av. Dr. Severino Pinheiro, onde fica uma das mais movimentadas paradas de ônibus da cidade. De fato, todas as paradas de ônibus localizadas no bairro são muito movimentadas, devido à localização estratégica do Derby e ao grande número de empresas, instituições de ensino e entidades aqui instaladas.
Reformada há pouco, a praça está bem cuidada e teve as altas grades que a cercavam – assim como alguns comércios instalados ilegalmente – removidos, proporcionando à população uma vivência melhor com o espaço urbano. “Apesar de ser no meio do movimento da cidade, a Praça do Derby é bem tranquila”, nos fala Ricardo Rama, enquanto caminhamos no lado sul da enorme praça.
Alguns casais namoram, pessoas apenas atravessam a praça ou descansam em seu interior. Encontramos um pequeno lago com bancos e um jardim. “As fotos do encarte do meu primeiro disco solo, Trovador psicodélico foram tiradas aqui”, relembra nosso guia. Nos arredores da Praça do Derby existem diferentes tipos de comércio e serviços como bares e restaurantes, laboratórios médicos e também um banco.
O clima ameno e calmo da enorme praça contrasta com a loucura e pressa do seu entorno. Atravessamos a via que corta a praça para chegar ao seu lado norte, onde encontramos um parque com brinquedos infantis. Rama lembra que, antigamente, havia um peixe-boi no laguinho da praça, verdadeira atração do lugar. Com seu espaço requalificado, a Praça do Derby está mais convidativa e começa a desfazer certa visão ruim que muitos moradores da cidade tinham dela.
Saindo da praça, um monumento chama a atenção. Ele traz a inscrição “Aqui jaz o homem, aqui nasce o herói”, e faz justa e bela homenagem a todos aqueles agentes da lei que tombam em serviço para proteger a população. Continuando nossa exploração, rumamos para a Capela do Derby. Bonitos painéis adornam suas entradas, voltadas para as Ruas da Baixa Verde e Feliciano Gomes. No momento em que chegamos, testemunhamos a realização de uma missa.
Mais à frente, avistamos o Quartel do Derby (Quartel da Polícia Militar de Pernambuco). Aqui ficava o hipódromo inaugurado em 1888 pela Sociedade Hípica Derby Club, o Hipódromo do Derby. Apesar do curto período de funcionamento, a pista de corrida deixou uma marca na vivência da cidade, e a população passou a chamar a localidade de Derby, nome mantido até hoje, mais de um século depois.
Após a desativação da pista de corridas de cavalo, o empresário Delmiro Gouveia transformou o terreno no Mercado Modelo Coelho Cintra. O mercado agregava, além de diversos produtos, lazer para seus clientes, mas também teve vida curta: em 1900, foi destruído por um incêndio tido como criminoso e cometido pela polícia da época por questões políticas. Em 1924, o edifício – após uma revitalização – passou a abrigar o Quartel da Polícia Militar de Pernambuco, até hoje.
Em frente da bela construção há um campo de futebol e uma pista de atletismo, que encontramos sendo utilizados por dezenas de pessoas. O complexo também dispõe de duas quadras. Subindo a Rua Clemente Pereira, encontramos outro abrigo para estudantes, a Casa do Estudante do Nordeste. Como os nomes indicam, essa casa acolhe estudantes de outros Estados do Nordeste, enquanto a Casa do Estudante de Pernambuco abriga alunos vindos de outras cidades do nosso Estado.
Muito próximo, uma faculdade garante movimento constante na Praça Guilherme Pinto. Na área também ficam alguns bares e restaurante, além de serviços ligados aos estudantes, como xerox. Terminamos nosso passeio no ateliê do artista plástico Eudes Mota, que encontramos trabalhando em mais uma série de trabalhos visuais.
Ricardo Rama nos apresenta o filho do artista plástico, o músico Matheus Mota, que trouxe para cá seu piano e utiliza um cômodo da casa para ensaiar e praticar o instrumento. Quem o acompanha quando chegamos é o também cantor e compositor D’Mingus, com quem Matheus tem parcerias musicais. O pequeno espaço já dispõe de uma bateria e o plano é transformá-lo em um estúdio próprio para o jovem pianista ensaiar com seus projetos musicais.
Ao som do piano, mais uma vez constatamos que é imensurável a riqueza contida em cada rua, praça ou construção de uma cidade histórica e, por isso mesmo, tão cheia de histórias e vivências. O Derby é o quadragésimo primeiro bairro visitado pela Agenda Cultural do Recife nesta série Meu Bairro... Moro Aqui, e a cidade do Recife já nos ensinou que nunca se esgota a capacidade de nos surpreendermos e aprendermos com complexa vida cotidiana.
Fotos Joás Benedito
Derby
Muito mais do que território, limites ou geografia, uma cidade é feita de pessoas e suas histórias, seus hábitos e seus modos de se relacionar com o espaço urbano. Essa relação muda com o tempo e os lugares da cidade vão assumindo novos significados para seus habitantes, que muitas vezes não se dão conta dos motivos que levaram uma localidade a ter determinado nome ou de como surgiram as incríveis histórias que cada recanto guarda em sua história.
Localizado em um ponto estratégico não só do Recife, mas de toda a Região Metropolitana, o Derby funciona como o cruzamento dos eixos norte-sul e leste-oeste que orientaram e orientam o crescimento urbano da metrópole e sua mobilidade. Tradicionalmente ocupado por moradores de alto poder aquisitivo, o bairro dispõe de estrutura urbana e comércio e serviços abundantes, além de instituições importantes e o Hospital da Restauração, maior emergência de Pernambuco.
Quem nos apresenta o bairro onde mora desde um ano de idade é o músico multi-instrumentista Ricardo Mancilha, que adotou o nome artístico Rama. Ele toca com vários grupos, como o Samsara, de música instrumental, e a banda Ilustres Visitantes. “Todo mundo sabe onde fica o Derby”, afirma Rama, enquanto fala das vantagens de se morar aqui. Começamos nossa caminhada na Rua Luiz Barbalho, e Rama nos indica a casa nº 254: “Valdemar de Oliveira morou aqui”, afirma nosso guia.
A casa ainda pertence à família e encontramos Fernanda Pimentel de Oliveira, bisneta de Valdemar de Oliveira. “Todos na família já fizeram pelo menos uma peça”, diz a jovem, enquanto nos conduz a uma casa conjugada, onde seu bisavô se reunia com amigos e artistas. No interior, encontramos um pequeno tesouro de objetos e imagens que remetem a uma rica convivência cultural. Na parede e até no teto, dezenas de pessoas deixaram recados, desenhos, poemas.
Quem nos apresenta o bairro onde mora desde um ano de idade é o músico multi-instrumentista Ricardo Mancilha, que adotou o nome artístico Rama. Ele toca com vários grupos, como o Samsara, de música instrumental, e a banda Ilustres Visitantes. “Todo mundo sabe onde fica o Derby”, afirma Rama, enquanto fala das vantagens de se morar aqui. Começamos nossa caminhada na Rua Luiz Barbalho, e Rama nos indica a casa nº 254: “Valdemar de Oliveira morou aqui”, afirma nosso guia.
Parede da Casa de Valdemar de Oliveira assinada por vários artistas |
A casa ainda pertence à família e encontramos Fernanda Pimentel de Oliveira, bisneta de Valdemar de Oliveira. “Todos na família já fizeram pelo menos uma peça”, diz a jovem, enquanto nos conduz a uma casa conjugada, onde seu bisavô se reunia com amigos e artistas. No interior, encontramos um pequeno tesouro de objetos e imagens que remetem a uma rica convivência cultural. Na parede e até no teto, dezenas de pessoas deixaram recados, desenhos, poemas.
Artistas da grandeza de Capiba, Chico Buarque, Vinicius de Moraes, Lula Cardoso Ayres, Millôr e muitos outros deixaram sua marca nessas paredes. “A gente tinha um quarto cheio de livros até o teto, que doamos”, diz Fernanda. O imóvel está sendo reformado para ser alugado e esse singelo tesouro da convivência de Valdemar de Oliveira ficará apenas em fotos e lembranças.
Estátua de Dom Helder em frente à Igreja da Fronteira |
Continuando, chegamos à Igreja das Fronteiras, onde morou Dom Helder Camara. Logo ao lado fica a Casa Provincial Nossa Senhora das Graças. Aqui fica também um memorial e o Centro de Documentação Helder Camara. Na frente da bela igreja nos deparamos com uma estátua de Dom Helder, o “dom da Paz”, que se inseriu de maneira definitiva na vivência do Estado por sua ação religiosa, social e política.
Seguindo, alcançamos a Av. Agamenon Magalhães. Além de ser a mais movimentada do bairro, a via é uma das principais de toda a Região Metropolitana. O vai e vem incessante de automóveis e pedestres acelera nosso passo e chegamos à Rua Henrique Dias. Logo encontramos a Casa do Estudante de Pernambuco, fundada em 1931. Bem em frente fica o Colégio da Polícia Militar. Muito próximo, Ricardo Rama aponta o Instituto de Recursos Humanos (IRH): “eu trabalho aqui”, afirma nosso guia, enquanto ressalta as vantagens de ir e voltar a pé para o trabalho.
Ainda na mesma rua fica o Cinema da Fundação, sala de cinema mantida pela Fundação Joaquim Nabuco. Ricardo Rama frequenta o cinema porque “aqui passam filmes ignorados pelo circuito comercial”, como explica. Na entrada, uma loja da Editora Massangana – também da Fundaj – oferece livros e publicações diversas. Entramos e encontramos Kléber Mendonça Filho, que trabalha há 13 anos no cinema e, desde 2001, divide com Luiz Joaquim a escolha dos filmes que são exibidos aqui.
Sala José Cavalcanti Borges, do Cinema da Fundação |
Entramos na sala de exibição, que tem 200 lugares, sendo 3 para cadeirantes. A assistente dos diretores, Vera Cavalcanti, explica que o espaço também dialoga com entidades próximas, como a Escola da Polícia Militar, que realiza eventos aqui. Saímos do cinema e seguimos pela Rua Jener de Souza, onde encontramos o Memorial da Medicina de Pernambuco.
Memorial da Medicina de Pernambuco |
Chegamos à Praça do Derby, cortada ao meio pela Av. Dr. Severino Pinheiro, onde fica uma das mais movimentadas paradas de ônibus da cidade. De fato, todas as paradas de ônibus localizadas no bairro são muito movimentadas, devido à localização estratégica do Derby e ao grande número de empresas, instituições de ensino e entidades aqui instaladas.
Reformada há pouco, a praça está bem cuidada e teve as altas grades que a cercavam – assim como alguns comércios instalados ilegalmente – removidos, proporcionando à população uma vivência melhor com o espaço urbano. “Apesar de ser no meio do movimento da cidade, a Praça do Derby é bem tranquila”, nos fala Ricardo Rama, enquanto caminhamos no lado sul da enorme praça.
Ricardo Rama, nosso guia |
Alguns casais namoram, pessoas apenas atravessam a praça ou descansam em seu interior. Encontramos um pequeno lago com bancos e um jardim. “As fotos do encarte do meu primeiro disco solo, Trovador psicodélico foram tiradas aqui”, relembra nosso guia. Nos arredores da Praça do Derby existem diferentes tipos de comércio e serviços como bares e restaurantes, laboratórios médicos e também um banco.
O clima ameno e calmo da enorme praça contrasta com a loucura e pressa do seu entorno. Atravessamos a via que corta a praça para chegar ao seu lado norte, onde encontramos um parque com brinquedos infantis. Rama lembra que, antigamente, havia um peixe-boi no laguinho da praça, verdadeira atração do lugar. Com seu espaço requalificado, a Praça do Derby está mais convidativa e começa a desfazer certa visão ruim que muitos moradores da cidade tinham dela.
Saindo da praça, um monumento chama a atenção. Ele traz a inscrição “Aqui jaz o homem, aqui nasce o herói”, e faz justa e bela homenagem a todos aqueles agentes da lei que tombam em serviço para proteger a população. Continuando nossa exploração, rumamos para a Capela do Derby. Bonitos painéis adornam suas entradas, voltadas para as Ruas da Baixa Verde e Feliciano Gomes. No momento em que chegamos, testemunhamos a realização de uma missa.
Mais à frente, avistamos o Quartel do Derby (Quartel da Polícia Militar de Pernambuco). Aqui ficava o hipódromo inaugurado em 1888 pela Sociedade Hípica Derby Club, o Hipódromo do Derby. Apesar do curto período de funcionamento, a pista de corrida deixou uma marca na vivência da cidade, e a população passou a chamar a localidade de Derby, nome mantido até hoje, mais de um século depois.
Após a desativação da pista de corridas de cavalo, o empresário Delmiro Gouveia transformou o terreno no Mercado Modelo Coelho Cintra. O mercado agregava, além de diversos produtos, lazer para seus clientes, mas também teve vida curta: em 1900, foi destruído por um incêndio tido como criminoso e cometido pela polícia da época por questões políticas. Em 1924, o edifício – após uma revitalização – passou a abrigar o Quartel da Polícia Militar de Pernambuco, até hoje.
Quartel do Derby |
Muito próximo, uma faculdade garante movimento constante na Praça Guilherme Pinto. Na área também ficam alguns bares e restaurante, além de serviços ligados aos estudantes, como xerox. Terminamos nosso passeio no ateliê do artista plástico Eudes Mota, que encontramos trabalhando em mais uma série de trabalhos visuais.
Ricardo Rama nos apresenta o filho do artista plástico, o músico Matheus Mota, que trouxe para cá seu piano e utiliza um cômodo da casa para ensaiar e praticar o instrumento. Quem o acompanha quando chegamos é o também cantor e compositor D’Mingus, com quem Matheus tem parcerias musicais. O pequeno espaço já dispõe de uma bateria e o plano é transformá-lo em um estúdio próprio para o jovem pianista ensaiar com seus projetos musicais.
Ao som do piano, mais uma vez constatamos que é imensurável a riqueza contida em cada rua, praça ou construção de uma cidade histórica e, por isso mesmo, tão cheia de histórias e vivências. O Derby é o quadragésimo primeiro bairro visitado pela Agenda Cultural do Recife nesta série Meu Bairro... Moro Aqui, e a cidade do Recife já nos ensinou que nunca se esgota a capacidade de nos surpreendermos e aprendermos com complexa vida cotidiana.
Avenida Agamenon Magalhães |
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