1997: Um presságio do cinema contemporâneo

Por: Anax Botelho, Joás Benedito e Raquel Freitas

Fotos: Anax Botelho e Joás Benedito 
Foto: Divulgação
Ao folhear qualquer arquivo sobre o cinema pernambucano vai ser difícil não encontrar uma frase exaltando a importância do filme o Baile Perfumado para o
Estado. Folhear no sentido literal da palavra, pois, em simples conversas com quem teve participação direta ou indireta nessa fase, vai ser fácil identificar no olhar o que o filme representou para as pessoas que gostavam ou produziam cinema no final da década de 1990. Todas as lembranças que resguardam esse tempo vêm sendo citadas atualmente na tentativa de reafirmar o marco deixado pela produção de Paulo Caldas e Lírio Ferreira.

O período entre os filmes O palavrão, de Cleto Mergulhão, em 1978, e o Baile Perfumado, em 1997, registrou uma época de recesso nas produções cinematográficas, principalmente na era Collor, quando os financiamentos à produção cultural foram interrompidos. Sem incentivo, a produção tornou-se praticamente inviável. Os bons momentos começaram a surgir quando os filmes começaram a entrar em processo de realização. No livro de Alexandre Figueirôa, Cinema pernambucano: uma história em ciclos, ele relembra que Baile perfumado era na época uma empreitada audaciosa, visto que as condições eram mínimas para se rodar um filme e, mais precisamente, um longa-metragem comercial. Notando as dificuldades, os realizadores começaram a pressionar o governo estadual para a implantação de meios que pudessem financiar projetos culturais. Foi então que a Secretaria de Cultura estadual elaborou uma legislação de apoio aos projetos culturais, promovendo também concursos de roteiros para cinema e vídeo dentro do Estado. Foi a partir daí que Paulo Caldas e Lírio Ferreira puderam dar início à produção de Baile Perfumado, através do Prêmio Resgate do Cinema Brasileiro para diretores e estreantes, com verba disponibilizada pelo Ministério da Cultura
(MinC). Nos anos 90, então, as coisas começaram a fluir como deveriam, a abordagem de temáticas folclóricas começaram a mudar o estereótipo da cultura do cangaço, do sertão e também das frequentes cenas de pobreza.

Atualmente, depois do cinema pernambucano ter conquistado seu espaço e as políticas públicas e individuais terem fortalecido, o cenário cinematográfico mudou de temática. Segundo o diretor do festival Cine PE, Alfredo Bertini, qualquer produto que seja repetido pode levar a um processo de saturação, uma reação natural de quem consome. Mas, para que isso se torne acessível, é preciso ter muito talento, muito reconhecimento. “O importante é compreender que você pode ter a liberdade de criar e de se expressar na arte, você tem que entender que o público também tem a sua forma de reagir. Isso é o exercício democrático”, afirma o diretor. Já a nutricionista Isabele, que compareceu ao Cine PE este ano, diz que a forma da divulgação cultural dentro do cinema é importante, apesar de que nem toda a população possua esclarecimentos sobre assuntos relacionados ao processo técnico do cinema. “Eu acho bem interessante, há uma massa jovem interessada e a produção nacional vem aumentando em cima disto”, relata.

Existe uma visibilidade para os filmes pernambucanos, principalmente quando eles são exibidos em festivais locais, os quais são frequentados por pessoas de outros Estados, e isso faz com que as produções sejam vistas sob diferentes aspectos. “Para mim, a grande estrela de um festival é o público”, fala Luci Alcântara – cineasta e diretora do documentário JMB – O famigerado, vencedor dos prêmios Júri Popular e Especial do Júri Oficial do Cine PE 2011 – a respeito da fidelidade dos espectadores pernambucanos. O cinema hoje é visto como um polo de tradição que tende a divulgar a cultura de Pernambuco. Paulo de Tarso Lins, da Aurora Filmes, afirma que o cinema corresponde a uma realidade de memória. “Os diretores que produzem filmes em Pernambuco têm a coerência de fazer um trabalho baseado em um passado que de fato foi promissor e que hoje corresponde à realidade”, afirma o músico e cineasta.

O domínio da linguagem e a criatividade dos autores têm permitido a realização de trabalhos de bom nível técnico e estético, graças à existência de pessoas formadas e estabelecidas na área. E com a ajuda de grandes festivais de audiovisual, é possível notar que outros centros culturais começam a olhar Pernambuco como um grande polo de manifestação cultural, isso não só em termos qualitativos, mas também no tamanho estrutural.  

Essas razões tornam o cinema de Pernambuco cada vez mais forte. E são as diversidades de linguagens e a liberdade de criação que vêm fazendo de Pernambuco um Estado aberto a esse tipo de produção, possibilitando assim uma maior visibilidade dentro e fora do país.

Festivais de Cinema

Pipoca, amigos e ingresso na mão. Assim se caracteriza qualquer espaço destinado à exibição de filmes em todos os lugares. Porém nada pode ser semelhante à atmosfera presente nos festivais destinados às produções cinematográficas. São horas e horas interruptas de exibição de filmes, apenas com pequenos intervalos para uma visita ao banheiro, para beber água e discutir um pouco sobre cinema com o restante do público. Além dos muros dos tradicionais espaços comerciais, o cinema cresce em público graças aos preços acessíveis, lotando teatros e espaços culturais nesses festivais. Para quem não conhece o trabalho, fica provavelmente difícil imaginar que nesses espaços não sejam necessários aqueles vídeo de aviso para desligar o celular ou os “psius” tão comuns. Por ser frequentado na maioria das vezes por profissionais do cinema, isso se torna um diferencial desses encontros, onde o público após assistir a um filme poder ver e até conversar com os artistas, os diretores, os roteiristas, enfim, como todos os envolvido na produção das obras que o público acaba de prestigiar, tornando-se parte integrante do universo que a 7ª arte envolve.

Como espaços democráticos, os festivais são principalmente destinados aos filmes independentes e nacionais, com o objetivo de levar essas produções ao grande público. Tais eventos são celeiros que abrigam além de estudantes de cinema, jornalistas e novos produtores, e qualquer pessoa que sinta vontade de integrar os circuitos cinematográficos. Com nomes prestigiados e a missão de construir um debate permanente sobre técnicas e processo criativo, ao passar dos anos os festivais crescem e o público cada dia se sente mais representado fora do poderio estritamente comercial e industrializado. O mesmo ocorre com os profissionais, que disputam premiações e veem seu trabalho reconhecido.

Em Pernambuco, há cineclubes como Aurora Filmes, Coliseu, do Instituto Cervantes, Brasil-Itália, Curta Doze e Meia, entre outros, que conseguem reproduzir um pouco o clima dos encontros dos cinéfilos. Os destaques ficam com os grandes eventos: Janela Internacional de Cinema do Recife e o Cine PE – Festival do Audiovisual, o qual já exibiu mais de 400 filmes entre curtas e longas durante seus 15 anos de história, tornando-se o maior festival do Estado. Assim é a realidade dos festivais e do cinema nacional, em busca de arte e principalmente do fortalecimento da cultura

Filmes premiados

Foto: Divulgação
Baile Perfumado / Paulo Caldas e Lírio Ferreira (1996)
Festival de Brasília 1996
Venceu nas categorias de melhor filme, melhor cenografia e melhor ator coadjuvante (Aramis Trindade).
Festival de Havana 1997 / Cuba
Categoria de melhor cartaz.
Prêmio APCA 1998.
Categoria de melhor trilha sonora e melhor ator coadjuvante (Luiz Carlos Vasconcelos).

O rap do pequeno principe contra as almas sebosas / Paulo Caldas e Marcelo Luna (2000)
II Festival Internacional de Cinema de Brasília.
Troféu Buriti de Prata, como melhor filme pelo público.
V Festival Internacional de Documentários É Tudo Verdade.
Prêmio de melhor filme pelo público e o prêmio GNT de renovação de linguagem do documentário brasileiro.

Amarelo Manga / Cláudio Assis (2003)
Cinema Brasil
Melhor fotografia, doze indicações nas seguintes categorias: melhor filme, melhor diretor, melhor ator (Chico Diaz e Matheus Nachtergaele), melhor atriz (Dira Paes e Leona Cavalli), melhor ator coadjuvante (Jonas Bloch), melhor roteiro original, melhor figurino, melhor maquiagem, melhor direção de arte e melhor montagem.
Festival de Berlim
Prêmio C.I.C.A.E. no Fórum do Novo Cinema.
Festival de Brasília
Candangos de melhor filme, melhor ator (Chico Diaz), melhor fotografia e melhor edição. Melhor filme - público, melhor filme - crítica e o prêmio especial do Júri, para a atriz Dira Paes.
Festival de Cinema Brasileiro de Miami
Melhor Fotografia.

Cinema, Aspirinas e Urubus / Marcelo Gomes (2005)
Festival de Cannes de 2005
Prêmio da Educação Nacional , criado pelo Ministério da Educação Nacional, que prevê a distribuição do filme, através de um DVD pedagógico, para aproximadamente um milhão de estudantes franceses. Este prêmio foi recebido pelos cineastas Gus Van Sant (Elephant, 2003) e Emir Kusturica (A Vida é um Milagre, 2004).
Destaque das principais revistas de cinema: The Hollywood Report, Variety e Screen International.
Festival Internacional do Rio de Janeiro
Prêmio especial do júri e o prêmio de melhor ator.
29ª Mostra Internacional de São Paulo 2005
Prêmio máximo de melhor filme (Bandeira Paulista).
Prêmio de melhor ator, prêmio da crítica (João Miguel).
Amazonas Film Festival 2005
Prêmio especial do júri.
Festival de Santa Maria da Feira - Portugal 2005
Prêmio de melhor filme do júri, melhor filme do Clube de Cinema.
Festival Internacional de Mar del Plata - Argentina 2006
Considerado o melhor filme Iberoamericano.
FestivalInternacional de Guadalajara - México 2006
Troféu de melhor filme Iberoamericano e Melhor Ator.
Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) 2005
Recebeu os prêmios de melhor filme, melhor fotografia.
Festival SESC Melhores do Ano
Considerado o melhor filme pela crítica e pelo público; melhor diretor, pela crítica e pelo público, melhor ator, pela crítica e pelo público.
Festival de Cinema de Cuiabá 2006
Escolhido como melhor filme, melhor ator e melhor produção.
Associação Brasileira de Cinematografia 2006
Recebeu o prêmio de "Melhor Fotografia".

Árido Movie / Lírio Ferreira (2006)
Grande Prêmio Cinema Brasil
Doze indicações, nas categorias de melhor filme, melhor diretor, melhor ator (José Dumont), melhor ator coadjuvante (Selton Mello e Aramis Trindade), melhor atriz coadjuvante (Mariana Lima), melhor roteiro original, melhor figurino, melhor trilha sonora, melhor direção de Arte, melhor fotografia e melhor som.
Cine PE - Festival do Audiovisual
Seis prêmios, nas categorias de: melhor filme, melhor diretor, melhor ator coadjuvante (Selton Mello), melhor fotografia, melhor edição e prêmio da crítica.
Festival de Cinema Brasileiro de Miami
Prêmio Lente de Cristal na categoria de melhor diretor.

Baixio das Bestas / Cláudio Assis (2007)
Festival de Brasília
Prêmios de melhor filme, melhor atriz (Mariah Teixeira), melhor ator coadjuvante (Irandhir Santos), melhor atriz coadjuvante (Dira Paes), melhor trilha sonora e o prêmio da crítica.

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