Livro conta a história do americanismo no Recife: Yes, nós temos Coca-Cola!



Quem disse que jornal do dia anterior não serve para nada? Nas mãos do escritor, gastrônomo e historiador Frederico Toscano, jornais com décadas de publicados deram vida ao título Yes, nós temos Coca-Cola - A fartura dos Estados Unidos e a guerra contra a fome no Nordeste. O livro traz uma narrativa histórica da cultura alimentar na região, em especial no Recife, e será lançado pela Cepe Editora quinta-feira (12), às 18h30, no Rooftop da ABA Global Education, localizado no bairro de Aflitos (Recife).


É por meio de notas e artigos de jornais, de acervo de instituições de pesquisa no Brasil e no exterior e de obras literárias que Frederico Toscano conta essa história. Ele aborda o período que vai de 1930, com a implantação do Estado Novo de Getúlio Vargas, até 1964, o início da ditadura militar no país. Nesse recorte está inserido o tempo em que o Recife serviu de base naval dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial e funcionou como sede da 4ª Frota, na década de 1940.


Americanismo, fartura, carestia e escassez de alimentos - efeitos da guerra ou resultado de especulação praticada por comerciantes - são detalhadas nas 552 páginas da publicação. Frederico Toscano resgata projetos de cultivo de hortas nos quintais brasileiros, para diminuir a insuficiência de comida nas casas no período da guerra e, ao mesmo tempo, mostra como os recifenses pegaram gosto por Coca-Cola, uísque, brandy, coquetéis, canapés e cachorro-quente.


“Uma horta em cada quintal era o tema da campanha, que alertava as brasileiras para as dificuldades de se conseguir frutas e hortaliças”, diz Frederico Toscano no capítulo A batalha da produção e os conflitos do cotidiano. “Seis meses após o início da campanha, a imprensa já considerava que a região Nordeste havia se tornado um verdadeiro celeiro das Nações Unidas, e as hortas se multiplicavam pelo Recife, entre particulares e instituições”, relata o escritor na publicação.


A partir de receitas de coquetéis divulgadas em jornais, mulheres trocavam informações sobre a mistura de bebidas tão norte-americana. O autor descreve essa rede feminina como “postagens que eram visíveis a todos os que lessem o suplemento, de maneira não muito diferente das redes sociais eletrônicas da atualidade.” A Coca-Cola, diz ele, conquistou o paladar de moradores da cidade a partir da Segunda Guerra Mundial. Com soldados norte-americanos para cá e para lá em ruas e bares, os jovens aprenderam a beber o refrigerante direto do gargalo da garrafa.


Por meio do acordo Brazilian Food Suply, assinado em 1942, os Estados Unidos e o Brasil organizaram ações para aumentar a produção alimentar em solo brasileiro e ofertar cursos técnicos. “Relatórios do exército norte-americano demonstram que seu propósito também era fornecer alimento não só para os militares de ambos os países, mas também às populações civis residentes nas áreas cobertas pelo projeto. Do norte da Bahia até a Amazônia, 12 estados foram contemplados, e a ideia era promover um impacto duradouro na agricultura desses lugares”, escreve.


Frederico Toscano / Divulgação


De acordo com Frederico Toscano, projetos de produção suína foram implantados no Recife, Natal, Fortaleza, São Luís e Belém, envolvendo inicialmente cerca de 2 mil animais que, quando abatidos, eram destinados às bases militares norte-americanas e depois à população civil local. “Construiu-se um laboratório para a fabricação de soros e vacinas para gado e aves no Recife, além de 22 granjas nas regiões Norte e Nordeste, com capacidade para 39 mil aves, servindo para experimentos de melhoramento das espécies. Foram iniciados três grandes centros de produção na região amazônica, consistindo em aproximadamente 600 hectares cada, nas cidades de Santarém, Caldeirão e Rio Branco. Deveriam servir de fazendas-modelo para estudantes de agricultura e, mais importante, atender parte das necessidades alimentares da crescente população de seringueiros do Norte do país. Seis centros de treinamento agrícola foram desenvolvidos na Bahia, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Ceará e no Amazonas”, revela.


O historiador analisa a repercussão social dos novos costumes em festas, como os buffets modernos, práticos e informais à moda americana (cada um se serve) no lugar de jantares sóbrios típicos da França. Em 2014, ele lançou pela Cepe o livro À Francesa: A belle époque do comer e do beber no Recife, que trata do francesismo na capital pernambucana a partir do século 20, com enfoque especial na culinária. O título ficou em 3º lugar no Prêmio Jabuti de 2015, na categoria gastronomia.


Pelas fontes de pesquisa, Frederico também apresenta relatos da fome e mostra como alimentos descartados por soldados norte-americanos serviam de refeição para moradores pobres do Recife e de Natal (RN), onde os EUA também estavam presentes. Yes, nós temos Coca-Cola é fruto da tese de doutorado em história que ele defendeu na Universidade de São Paulo, em 2019. Mais do que novos hábitos, os Estados Unidos deixaram no Brasil a imagem de um país de abundância, como se vê na leitura do livro.



Serviço:


O que: Lançamento do livro Yes, nós temos Coca-Cola - A fartura dos Estados Unidos e a guerra contra a fome no Nordeste


Quando: 12 de maio


Hora: 18h30


Local: Rooftop da ABA Global Education - Avenida Santos Dumont, 300, Aflitos (Recife)


Preço do livro: R$ 70  (impresso) e R$ 28 (e-book)


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