Existe arte além das galerias


Obra de Isac Vieira
Foto: Jaciana Sobrinho

Por Erika Fraga e Jaciana Sobrinho 
Pintores, xilogravuristas, desenhistas, escultores, grafiteiros. Pernambuco abriga inúmeros desses artistas, alguns nativos, outros atraídos pelo cheiro da arte que nosso estado exala. Muitos nomes como Cícero Dias, Tereza Costa Rego, Abelardo da Hora, Samico e Daniel Santiago entram pelos olhos e ficam na memória, às vezes, também numa parede da sala, em cima da cristaleira ou no jardim de casa, para que quem chega veja tamanha beleza das obras.
 
O catálogo de artistas é imenso, mas o mercado não é tão amplo. Não é fácil obter espaço nas grandes galerias e expor nos museus da cidade. Mas nem por isso o trabalho deve se perder ou mofar num canto qualquer. Com trinta e cinco anos de carreira, o artista Isac Vieira é um exemplo de persistência e sucesso. Nascido em Alagoa Grande (PB) e morando no Recife desde os sete anos, Isac descobriu seu dom ainda criança, na fase escolar, quando reproduzia com primor qualquer desenho que lhe fosse apresentado.
 
“Aos quinze anos fiz meu primeiro quadro a óleo e já sabia que pintar era o que eu queria para o resto da minha vida. Eu aproveitava a loja de fotografia que pertencia ao meu pai para expor meus trabalhos e comecei a vendê-los lá mesmo”, lembra Isac, que é autodidata. Suas maiores influências são Monet, Renoir, Degas e Camille Pissarro. O artista conta que comprava alguns livros para apreciar as obras e aperfeiçoar seus próprios traços.
 
Na sua trajetória traz experiências como a de desenhar retratos nas ruas do Rio de Janeiro por quatro anos e participar de uma novela na TV Record com um quadro da atriz Patrícia de Sabrit. Diversos retratos feitos por ele estão expostos na Pontifícia Universidade Católica do Paraná e seus traços impressionistas e cubistas já estão espalhados pela Alemanha, Itália, Portugal e Espanha.
 
As obras de Isac são mais fáceis de encontrar do que se pode imaginar e estão logo ali, no centro do Recife, na cela 100 da Casa da Cultura, bairro de Santo Antônio. Na sala com cerca de 15 m², ele exibe rostos, paisagens e abstrações, sem esquecer a cultura pernambucana. Tudo isto com muitas cores e expressões. “Há vinte anos exponho e vendo meu trabalho aqui. Nunca me preocupei em estar nas galerias, embora esteja aberto a convites. Mas é aqui que minha arte é vista e é daqui que ela sai para lugares que nem imagino”, diz Isac.
 
Igualmente talentosa Regina Carvalho também começou a pintar na infância e aos dezessete anos participou pela primeira vez do Salão dos Novos – importante evento de arte moderna, em Olinda. Até os trinta e cinco anos (agora ela tem quarenta e nove), Regina participou ativamente do circuito de artes Recife-Olinda, mas em razão do nascimento do seu filho ficou durante um ano em casa e os espaços fecharam-se para ela. “Enquanto fiquei reclusa, eu desenhei e escrevi muito. Mas depois desse período, me desarticulei e perdi o rumo. Agora era o tempo da arte conceitual, das instalações e não caminhava por esse viés”, afirma.
 
A artista plástica, formada pela UFPE e especialista em arte/educação, leciona artes, tem cinco livros publicados – quatro de poesias e um de mapas afetivos. Já fez muitas ilustrações para livros e atualmente também é ilustradora científica do Laboratório de Morfotaxonomia da UFPE. Seu ponto forte são os desenhos, os quais ela mescla com as palavras e cria os mapas afetivos. “Tudo vira arte. Uma história de um amigo, um sentimento ou um fato político pode ser matéria-prima para o meu trabalho. A arte é a expressão da vida e a maior obra de arte é a vida”, reflete a artista.
 
Hoje em dia, Regina dedica-se aos seus ofícios e nos intervalos ela desenha. Os materiais estão sempre a bordo e qualquer lugar pode virar seu ateliê. Seus trabalhos, quase todos em preto e branco e em tamanho de papel A4, são ricos em detalhes e sempre têm um fundo de verdade. “Eu continuo produzindo, alguns amigos compram e indicam para outros amigos e assim eu movimento minha carreira artística. Falta pouco para eu me aposentar como professora e poder me dedicar totalmente à arte que está muito viva dentro de mim”, celebra Regina.
 
Obra de Pedro Cor
Foto: Divulgação
Muitos falam que a união faz a força. Foi se inspirando nesse pensamento que alguns artistas de Jardim Brasil-Olinda, criaram a Associação dos Artistas de Jardim Brasil, conhecida como Jartes. Comandada pelo artista plástico Clélio Freitas, o espaço criado em 2012 contempla obras de nomes como Chico de Assis, Dulce Ferreira, Edmilson Fontes, Graça Rua Gomes, Helena Antunes, Cícero Lins e o Centro Reciclo.
 
Andar pela Jartes é se deparar, a cada momento, com peças encantadoras. O estilo distinto de cada artista contribui ainda mais para enriquecer o acervo do atelier. “Criamos o espaço para fortalecer os artistas do bairro, no entanto, são poucos os que nos procuram. A galeria é para todos e está aberta para a comunidade. Já recebemos visitas de escolas e faculdades, e isso é importante não só para nós como artistas, mas também para a formação dos novos cidadãos”, pontua Clélio.

Clélio que se considera um “cata plástico”, e não um artista plástico. Aprendeu o ofício da fundição de metais com o pai João Bezerra. Ele, que participou da construção do Marco Zero do Recife, começou fazendo peças industriais: criava disco de moagem para fazenda de café, tampões para boca de lobo, postes de ferro, lampiões, bancos de jardins, já teve uma firma de fivelas de cintos e também trabalhou com bijuterias finas. Só a partir do ano de 2000, que ele começou a fazer esculturas em alumínio. Entre as peças produzidas estão chaveiros, porta-chave, cinzeiro, peso de papel, esculturas e troféus para algumas instituições como o projeto Ação e Cidadania. Cerca de 80% de suas peças são vendidas no Museu dos Tubarões, localizado em Fernando de Noronha.
 
A sucata também vira obra de arte quando é tocada por Clélio, exceto o alumínio, toda matéria-prima usada por ele são doadas ou retiradas do lixo. “Hoje estou trabalhando em cima do frevo criando muitas figuras carnavalescas como o caboclo de lança, a passista, a rainha do maracatu, todas feitas com sucata que iriam poluir o meio ambiente, mas que com criatividade passaram a ser objetos de ornamentação”, revela.
 
Pedro teve uma formação instintiva, tudo o que sabe aprendeu na prática, sua aproximação com a arte e o seu caráter contestador vieram do seu envolvimento com o Movimento Punk Rock. “Aprendi com o Punk a filosofia do ‘faça você mesmo’, me envolvi inicialmente com a parte gráfica desenvolvendo cartazes para shows e camisetas, depois passei a trabalhar com a serigrafia, também produzi muito Fanzine”, comenta. Segundo Pedro, só quando ele foi morar em Olinda, em 1995, conseguiu encontrar seu verdadeiro caminho nas artes e perceber que existe arte também na periferia. Hoje ele ministra, no Reciclo, oficinas de serigrafia com objetivo de incentivar as pessoas a conhecerem novas técnicas.
Cavalo - Chico de Assis
Foto: Divulgação
 
Também encontramos na Jartes o Chico de Assis, um artista multifacetado que além de desenhar é escultor. Sua maior paixão é produzir silenciosamente esculturas femininas. Suas peças elaboradas em resina e fibra de vidro são muito requisitadas por donos de motéis. Apaixonado pelas formas femininas, Chico ressalta que assim como ele outros artistas também se inspiram nelas no momento da criação. “As formas femininas são lindas, inclusive Oscar Niemeyer tem suas obras inspiradas nas curvas e volúpias das mulheres. Gosto de ressaltar que nascemos de uma mulher, ela é o nosso primeiro cosmo, no útero dela nos 
desenvolvemos e através dela nos alimentamos, a mulher é extraordinária”, comenta com os olhos brilhando. 
 
Chico, que é nascido em Pesqueira e radicado em Olinda desde os 10 anos de idade, principiou na arte com desenhos em bico de pena, com um trabalho minucioso, quase como um bordado, ele foi criando um estilo que une a religiosidade ao cangaço. Aos 14 anos, teve suas primeiras peças expostas na Oficina de Francisco Brennand, eram dois quadros que foram vendidos a um casal, donos de galeria em Nova Iorque. Em 1972, ele fez uma exposição inspirado na obra Ariano Suassuna, nessa exposição o próprio Ariano lançou o livro d’A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta. “Levei 14 desenhos e todos foram vendidos. O evento aconteceu no Pátio de São Pedro, na livraria que se chamava Cordel, na época pertencente a Paulo da Fonte”, relembra.
 
Recentemente ele participou da Exposição do IMIP, com um quadro feito em bico de pena, cujo tema explorava o Apocalipse de São João, destacando a figura da rainha do Apocalipse. Ele também tem uma escultura de latão exposta na galeria Arte Maior, em Boa Viagem. A mensagem mais importante que a Jartes procura passar para a sociedade é que existe arte em outras partes. É preciso que as pessoas saiam dessas famosas rotas das artes visuais e procure a periferia, pois lá também é um grande centro de cultura.
 Isac VieiraCasa da Cultura – Rua Floriano Peixoto s/n, Santo Antônio – Raio Oeste – Cela 100.8405 9007 | isac-vieira45hotmail.com | www.isacvieiraartes.com.br Regina Carvalho8872 5195 | reginahcarvalho@hotmail.com Clélio FreitasRua: Bahia, 57 - Jardim Brasil 2 – Olindajartesassociacao@gmail.com | jartesassociacao.blogspot.com.br Pedro CostaCentro RECICLO de Atividades Artísticas
Rua Ilhéus, 80 A. Jardim Brasil – Olinda
8846 9482 | 9701 6987 | centroreciclo.blogspot.com.br| www.flickr.com/photos/centroreciclo Chico de Assis8899 5887 | chicodeassis.arte@gmail.com

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