Entrevista: Elyanna Caldas



Por: Joás Benedito
Fotos: Joás Benedito

Quando se pergunta sobre música pernambucana, surge na mente o ritmo do frevo ou até mesmo a sonoridade do manguebeat, certo? Correto. Estilos esses que já são característicos e se tornam cada vez mais um referencial com o passar do tempo. Em contrapartida, vários músicos se destacam por estilos que são poucos divulgados nas rádios e na televisão. Vez por outra, muitos se dedicam a expor seus sentimentos em composições e acordes regidos de boas lembranças e afeto reproduzidos na profissão que, na maioria das vezes, não é reconhecida.
Influenciada pela irmã que tocava piano, aos 3 anos de idade Elyanna Caldas despertou seu interesse musical ouvindo composições carnavalescas e as reproduzindo ao piano. Professora da Universidade Federal de Pernambuco, escritora e diretora do Conservatório Pernambucano de Música, hoje ela se dedica apenas a tocar. Em conversa com o repórter Joás Benedito, Elyanna fala um pouco das suas participações musicais e a contribuição para que a música erudita do Estado seja um referencial para a geração atual.




Como foi traçada essa sua trajetória musical, quais foram as suas realizações durante esse tempo?
A minha vida musical foi um pouco às avessas. Com 20 anos, ganhei uma bolsa de estudos para ir para a França. Quando voltei dessas viagens, recebi um convite para ensinar na Universidade Federal de Pernambuco que estava fundando o curso de música, isso foi em 1960. Fui convidada para um cargo de nível superior por conta de certificados que eu tinha da Europa.  Não era um curso de graduação, até porque naquela época a graduação em música no Recife estava se iniciando. Eu como professora e sem graduação em música, fui fazer a graduação em letras só para ter um diploma brasileiro. No Brasil, sou diplomada em letras, línguas neolatinas como era chamada na época. Dez anos depois, voltei para a Europa e completei a minha licenciatura em música para me sentir feliz.

Capiba é considerado um dos maiores compositores de frevo do mundo. Como foi a experiência de explorar um pouco dele junto com os estilos erudito e popular?
Todas as duas experiências musicais faço com muito prazer, acho que a música erudita auxilia na popular e vice-versa. Capiba tem várias obras de choro para piano e valsas que eram desconhecidas, só conheciam o frevo e as marchas carnavalescas. Estava estudando um pouco de jazz e tenho um grupo chamado Tritonis, formado por mim no piano, Maurício Chiappetta na bateria e Thales Silveira no contrabaixo. Fiz dois discos de choro de Capiba, foi ele quem me fez conhecida na Europa. Acho que todo pernambucano gosta de frevo, choro, samba. Quando estava no conservatório, como diretora, tinha pouco tempo para estudar piano. Depois comecei a tocar choro com o Conjunto Pernambucano de Choro, de Marcos César. Fiz essas experiências do jazz com Mauricio e Thales e deu certo.

Grupo Tritonis - Elyanna Caldas, Thales Silveira e Maurício Chiappeta
Fora o Tritonis, quais são os outros grupos dos quais você participa?
Tenho um grupo de choro que toca comigo em Paris. O grupo não tem um nome definido, mas agora estou com outro chamado Capibando, composto por alguns músicos de São Paulo que ficaram encantados com a música de Capiba, formamos esse grupo por experiência e já tocamos umas seis vezes, inclusive no ano retrasado em Campinas onde tem um encontro de choro todo ano. O de lá se chama Capibando, aqui não tem nome, sou eu, Bozó no violão e sempre algum percussionista que aparece. Lançamos dois discos, o primeiro foi o Simplesmente Capiba e o segundo é o Capiba valsas e choros.  

Quais são as dificuldades que um pianista, no caso erudito, enfrenta aqui no Estado?
Para o músico erudito, as portas estão se fechando porque a música popular teve um avanço muito grande. Para se formar um pianista, precisa-se antes de tudo de um piano excelente. Os teatros novos não têm uma acústica tão boa quanto a do Teatro de Santa Isabel e também falta um bom empresário para estimular a música erudita em Pernambuco.

Em relação às escolas de música de Pernambuco, quais são os pontos positivos e negativos?
Temos as boas escolas de música do Recife como a da Universidade Federal, que se expandiu ultimamente, e o Conservatório Pernambucano de Música que ainda é um ponto de referência no Estado. Temos também o Conservatório de Olinda, que faz um bom trabalho. Mas acho que sempre falta verba para realizar uma atividade à altura dos empreendimentos que você quer executar. A música erudita está em segundo plano, embora continue presente, mas, por exemplo, os professores, aqueles que tiveram escolas tradicionais nas normas da Europa, já estão se aposentando. A turma jovem já está dentro da popular e sobre isso não tenho nada contra. Mas acho que a música erudita está em banho-maria.

Qual é a sua opinião sobre as banalizações que a música sofre?
Grupo Tritonis no Concerto na Igrejas
Eu lastimo. O mau gosto impera e – o que é pior – é supervalorizado.  Você liga a televisão e está lá, mais a música de má qualidade do que a de boa qualidade. Nossos jovens e crianças ficam ouvindo isso em casa e acham que é só aquilo que existe, infelizmente. Por exemplo, o frevo é uma maravilha, as boas marchas carnavalescas são músicas de classe e de alto valor.

Quais foram os retornos que a música lhe proporcionou?
Recebi prêmios que me garantiram essas idas à Europa. Com 20 anos de idade, tirei o 2º lugar no prêmio do Concurso da Rádio Ministério da Educação do Rio, no ano seguinte tirei o 1º lugar e isso me levou à Polônia. Jamais teria a possibilidade de ir à Europa se não fosse pelo meu próprio esforço, pelo trabalho dos meus professores e pela dedicação de minha mãe. A música me levou a lugares que eu nem pensava em estar, sou muito grata a todos e a tudo por isso.  Você tem que ter sonhos seguidos de perseverança e disciplina, a música não é um caminho fácil, principalmente aqui no Nordeste.

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